sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Alfabetização a partir do letramento: de fato, quando será possível?



A discussão sobre a formação de leitores e escritores críticos e competentes é um dos principais objetivos da educação. O domínio da linguagem é condição fundamental para o acesso ao conhecimento. O mundo atual exige a formação de pessoas capazes de relacionar textos, contextos e experiências vividas, capazes de identificar ideias, valores e de posicionar-se sobre eles. O estudo da linguagem possibilita uma ampliação de competências e habilidades envolvidas no uso da palavra e forma indivíduos capazes de utilizar adequadamente o discurso nas mais diversas situações de comunicação.
No mundo letrado, apenas a noção de ler e escrever um simples texto não é garantia de que esse processo de aprendizagem reduza a quantidade de analfabetos no país e forme indivíduos crítico para lidar com as diferentes formas de situações comunicativas.  Os textos comunicativos variam de acordo com o público a que se destinam com a intenção de quem os escreveu e com a finalidade com que foram escritos (informar, convencer, anunciar, seduzir ou divertir, entre outras). Para formar leitores e escritores competentes é preciso apostar em uma proposta educativa com base, principalmente, no diálogo, na formação que tenham liberdade para ler, escrever e interpretar o mundo, para refletir, analisar e criticar a realidade.
Acreditava-se que só o fato de passar pela “alfabetização”, o aluno conseguindo aprender a ler e escrever algumas palavras, frases e completar pequenos trechos narrativos, como acontecia na maioria das escolas e ainda é recorrente, esse aluno torna-se “apto” as práticas comunicativas. O texto de Magda Soares “Letramento e alfabetização: as muitas facetas” traz a discussão sobre o que se entende por alfabetização e letramento.  Ela mostra essa diferença utilizando dados do Censo de 1940, que entende como alfabetizado “aquele que declara saber e escrever, o que era interpretado como capacidade de escrever o próprio nome, capaz de ler e escrever um bilhete simples” e das Pesquisas Nacionais por Amostragem de Domicílios (PNAD) a extensão do conceito de alfabetização em direção ao conceito de letramento “do saber e escrever em direção ao ser capaz de fazer uso da leitura e da escrita em situações reais de comunicação”. Observamos que fora de um contexto real de comunicação, o processo de alfabetização desenvolvido por muitos docentes se limita ao ensino do sistema de escrita e leitura da língua que segundo Lúcia L. Browne Rego em Alfabetização e letramento: refletindo sobre as atuais controvérsias diz “Toda essa tradição estava vinculada a uma concepção segundo a qual, a aprendizagem inicial da leitura e da escrita tinha como foco fazer o aluno chegar ao reconhecimento das palavras garantindo-lhe o domínio das correspondências fonográficas [...]. Mas de uma maneira geral, tratava-se de uma visão comportamental da aprendizagem que era considerada acumulativa, baseada na copia, na repetição e no reforço”.
Todo esse processo de descoberta e adaptação para melhor contribuir na aprendizagem e formação dos alunos, não ocorreu desde a história inicial da educação do Brasil. O problema de habilidades de uso da leitura, escrita e reorientação dos alfabetizados funcionais são consequências de práticas educacionais voltadas para repetição, atividades mecânicas como decoração e copia de texto para que os alunos ficassem com a caligrafia bonita, a escrita do nome e leitura de textos como cartilha silábica que não contribuía para o pensamento critico.
O processo de aprendizagem de uma pessoa, desde o primeiro contato escolar, ao período final do ensino médio, em que se espera que os alunos mostrem domínio e competência linguística, faz-se necessário que desenvolva nesse período práticas de leituras e escrita voltadas para a realidade comunicativa desse aluno. A professora Lucinete Chaves de Oliveira em “Ler e escrever: os primeiros passos de uma longa trajetória aponta “O estudo confirma que as crianças de classe média, em cujos lares circulam jornais, revistas, livros e textos diversos, desde os bilhetes trocados entre os membros da família até o recebimento e envio de cartas, fax, correio eletrônicos, entre outros, terão maiores chances de compreender o funcionamento do nosso sistema de escrita, e algumas funções sociais. Já as crianças de grupos populares, pela falta de convivência em ambientes alfabetizadores como o descrito, terão maiores dificuldades para elaborar e reelaborar suas hipóteses iniciais acerca da escrita, rumo à compreensão do sistema alfabético.
A diversidade de gênero textual se dá conforme variam as intenções de quem fala ou escreve, e cada enunciado na verdade é uma manifestação organizada pela comunicação humana. Se o domínio da língua oral e escrita serve como passaporte para a ascensão e participação do indivíduo na sociedade, a escola não pode se omitir de sua função social. É necessário adequar às aulas, fazendo-as dialogar com a realidade linguística dos alunos. Em Morais e Albuquerque – Alfabetização e letramento: O que são? Como se relacionam? Como “alfabetizar letrando”? Os autores questionam como ajudar o aprendiz a apropria-se da linguagem que se usa ao escrever e dos usos e das finalidades da língua escrita? Teríamos um resultado significativo se a alfabetização e o letramento acontecem na mesma proporção.
Sabemos que o ensino sofreu mudanças significativas. Desde os anos de 1980, como diz Lúcia Lins Browne Rego “a alfabetização escolar no Brasil começou a passar por novos questionamentos, porém desta feita o foco das discussões era a emergência de novas concepções de alfabetização. Mesmo com o surgimento de mudanças, para muitos professores, o uso do texto em suas aulas continua sendo utilizado como pretexto para o estudo de letras, silabas, frases e leituras descontextualizadas. Estudam-se palavras, frases e empregos ortográficos como unidades isoladas da língua, bem distantes de sua real situação de uso, porém o estudo da língua deve ser voltado para o texto, às diversidades de gênero textual em que se materializam. Assim o aluno refletirá os modelos que já vivenciam e conhecem, e analisa os que ainda não fazem parte do seu repertório linguístico. Ser exposto aos diferentes gêneros textuais permite refletir sobre suas características específicas, escolhas linguísticas para adequar os textos às suas intenções comunicativas, além de acionar um pensar gramatical.
A leitura e a escrita são práticas fundamentais para uma análise linguística crítica, que leve em conta fatores sócio-cultural, geográfico, etário, grau de escolaridade, entre outros, ao estarem diante de qualquer texto, seja oral ou escrito. Desenvolver atividades de produção de texto, trabalhos de pesquisa e comparação de gêneros textuais, convida ao aluno a dirigir um olhar mais profundo para as particularidades dos gêneros. Confronta-os e leva-os a estabelecerem semelhanças e diferenças com relação à estrutura do texto, a organização de cada gênero e a abordagem do que está sendo passado através dele. Propostas desse ponto de vista permitem ao aluno perceber claramente os elementos lingüísticos da língua e contribuem para a formação de um leitor e escritor competente.
 Tendo em vista a crescente necessidade do ser humano adaptar a vida moderna, a escola deve contribuir para garantir ao individuo condições apropriadas para viver na sociedade dignamente. Para que a aprendizagem ocorra é preciso que a escola, representada pelo professor leve em consideração as situações reais de uso da escrita e da fala como mecanismo de interação social.
O receio do novo pode ser considerado normal por muitas pessoas, mas em certos momentos o medo não pode ser o pretexto para ficarmos estagnados no tempo, e não nos disponibilizarmos para refletirmos sobre nossas práticas didáticas no ensino. Mudar é preciso, principalmente, quando essa mudança é de caráter emergencial, sejam em um projeto, segmentos e etc. Tratando-se de educação, o que mais se deseja no momento é mudança, nisso inclui reavaliar as metodologias didáticas, planos de curso, atividades, usos de recursos didáticos, entres outros dos quais os professores utilizam no processo de ensino aprendizagem de uma língua. Morais e Albuquerque falam “Na prática das salas de aulas, muitos de nós continuamos enfrentado com dificuldade esta equação: como praticar uma alfabetização na perspectiva de letramento, sem tratar equivocadamente a escrita alfabética como um “código”, tal como fazer os métodos silábicos das velhas cartilhas? Como conciliar o aprendizado do diferentes gêneros apropriação da escrita silábica?”. A competência linguística é a capacidade de, em situações de interação comunicativa, produzir e compreender com sentido os textos. Aí o porquê de proporcionar o contato com e o trabalho do aluno com textos nas mais variadas situações de interação comunicativa para compreensão e análise dos efeitos de sentidos, dos recursos linguísticos, das situações de comunicação, das intenções explícitas e implícitas e para desenvolver a capacidade de produzir e de compreender textos.
Fala, leitura e escrita não são tarefas escolares que se esgotam em si mesma. São atividades sociais em que se reconhece a presença do outro, seja daquele que é convidado à interlocução, autor que é dos textos que lê ou escuta, seja daquele que é convidado à interlocução, destinatário que é dos textos orais ou escritos.
Cabe ao professor, como parte dessa ação pedagógica, ser o mediador entre o conhecimento e o aluno, ajudando-o a se transformar em um leitor que sabe se posicionar diante daquilo que lê, que sabe expressar sua ideias com clareza e com domínio da língua padrão.

Referências

SOARES, Magda. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação, 2004.
 OLIVEIRA, Lucinete Chaves de. Ler e escrever: os primeiros passos de uma longa trajetória.
REGO, Lúcia Lins Browne. Alfabetização e letramento: refletindo sobre as atuais controvérsias.

Acessados em agosto 2011:

Artigo de Artur Gomes de Morais,              p. 21-37


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