1. Conceito de Idade Media
Idade Média foi à expressão imprópria
aplicada ao período de mil anos que se iniciou no Ocidente com a derrocada do
Império Romano em 476, quando se deu a queda de Roma sob o reinado de Rômulo
Augústulo, enquanto em Bizâncio se mantinha o Império Romano do Oriente que se
prolongaria até a queda de Constantinopla sob os ataques dos turcos em 1453.
Durante os mil anos da nova idade, os bárbaros germânicos converteram-se à
religião cristã e assimilaram a cultura romana que a Igreja lhes preservou.
Surgiu, assim, no cenário da política mundial a Europa com um conjunto de
nações que ainda hoje conduzem a civilização, tal como a Alemanha, a França, a
Rússia, a Inglaterra, a Espanha, a Itália e as demais, e que deram origem às
modernas nações americanas. Durante essa Primeira Idade, como Gustave Cohen
gostaria que se chamasse a Idade Média, formou-se as línguas e as literaturas
das nações modernas, como a portuguesa; forjou-se uma nova e pujante
civilização com as suas instituições típicas tais como o parlamento, o júri, a
universidade, a arte gótica e as catedrais que assinalaram a civilização
européia. O historiador Roberto Lopez, no prefácio da sua obra Nascimento da
Europa, refere-se à Idade Média como "essa grande caluniada" e considera
o termo Idade Média como o mais desastrado dentre inúmeros rótulos apostos
pelos historiadores a cortes arbitrários do passado, pois a Idade Média
apresenta feições típicas, assim como aspectos positivos e negativos e por isso
não seria uma época de mera transição como o termo induz.
2 Periodização
da Idade Media
Do
ponto de vista da História da Educação pode adotar-se a seguinte periodização
da Idade Média:
a)
a primeira fase após a queda do Império Romano do Ocidente (476) até o reinado
de Carlos Magno no fim do século VIII, uma faixa de três séculos com a mesma
duração que no Brasil se estende de 1650 aos nossos dias. Este, o período que
os historiadores ingleses denominam de Dark Ages.
b)
A segunda fase alonga-se de 950 a 1200, ou seja, do fim da linguagem carolíngia
à concessão por Felipe Augusto dos primeiros privilégios reais à nascente
universidade de Paris. Este período equivale ao do apogeu da Idade Feudal.
c)
A terceira fase abrange o século XIII e termina com o gesto irreverente de
Nogaret que assinala simbolicamente o declínio da Idade Média.
d)
A quarta e última fase caracteriza-se pelas mudanças e convulsões sociais, pela
transição do feudalismo à monarquia, pela crise da cultura, decadência das
escolas e pelo surgimento do humanismo renascentista.
Na
primeira fase registra-se a decadência escolar do mundo antigo, a implantação
do monaquismo e a transmissão da cultura romana aos povos germânicos
cristianizados. Na segunda assinalam-se os renascimentos ou renovações da
cultura nos reinados de Carlos Magno, Alfredo, o Grande, e Otão, o cessamento
das invasões, o aumento da população, as grandes transformações econômicas, a
organização do feudalismo e o renascimento do século XII. A terceira fase
constitui o apogeu da civilização medieval com o florescimento das
universidades, a constituição da doutrina e do método escolásticos. A quarta
fase, finalmente, corresponde ao crepúsculo da Idade Média, à decadência
escolar e à crise da cultura do Ocidente, época agitada e convulsa em que entra
a surgir o Renascimento, verdadeira idade média entre a Primeira Idade da
Civilização Ocidental e a Europa moderna.
3. Educação e Vida Social: As Crianças, Os
Jovens, As Mulheres
A educação, antes de tudo,
tem como centro a família, como ocorre, em particular, nas sociedades
tradicionais. Uma família que, na Baixa Idade Média, tende a assumir aspectos
cada vez mais articulados, fazendo conviver tipos diversos de famílias, desde a
patriarcal até a nuclear; a primeira, central, sobretudo em áreas agrícolas; a
segunda, em áreas urbanas mais avançadas. De qualquer modo, porém, estamos
diante de uma família um pouco diferente da moderna e burguesa; seja patriarcal
ou nuclear, a família medieval é uma família aberta para a sociedade, que não
se fechou em núcleo privado, que acolhe quase todos os eventos da vida social
(desde o sexo até a morte). Na Idade
Média, de fato, as “cenas de interiores” da família são “muito raras” na
iconografia, também nas representações de eventos íntimos como o parto. E
faltam representações de grupos de família. Tudo isso enfatiza como a família
medieval é um organismo pouco estruturado, em estreita contigüidade e
continuidade com toda a vida social, na qual os problemas educativos também têm
escassa estruturação e pouca centralidade: a família cria os filhos, destina-os
a um papel na sociedade, controla-os de modo autoritário, mas não os reveste de
cuidados e de projetos, não os põe no centro da vida familiar, entrelaçando-os
num tecido educativo minucioso e orgânico.
As crianças na Idade Média têm um papel
social mínimo, sendo muitas vezes consideradas no mesmo nível que os animais
(sobretudo pela altíssima taxa de mortalidade infantil, que impedia um forte
investimento afetivo desde o nascimento), mas não na sua especificidade
psicológica e física, a tal ponto que são geralmente representadas como
“pequenos homens”, tanto na vestimenta quanto na participação na vida social.
Até os seus brinquedos são os mesmos dos adultos e só com a Época Moderna é que
se irá delineando uma separação. As festas religiosas, sazonais, civis também
acolhiam as crianças como espectadores e protagonistas, sem censuras. E até
mesmo os eventos dolorosos não excluíam a infância: morriam-se em público,
também na presença de menores. A educação da criança era depois confiada à
oficina e ao aprendizado ou à Igreja e às suas práticas de vida religiosa: a
primeira ensinava uma técnica e um ofício, a segunda, uma visão do mundo e um
código moral. A imagem da infância na Idade Média é a cristã: a meio caminho
entre “pecado” (idade pecaminosa, amoral, segundo Santo Agostinho) e
“inocência” (idade de graça, privilegiada e exemplar, como dizem os
Evangelhos); as condições de vida da infância são sempre duríssimas, marcada
pela escassez de bens, por violências e marginalização. Até o corpo infantil é
reinterpretado através da ideologia, dos princípios da astrologia, dos
princípios da hereditariedade como repetição necessária de disposições e
comportamentos, dos princípios da medicina.
Ao lado da criança, outra figura marginal
é a da mulher: subalterna ao homem, até mesmo na criação (já que deve ser menos
alimentada), alheia à educação; ao mesmo tempo marginalizada e exaltada, como
ocorre na ideologia cristã. Só que a Idade Média retoma sob dois aspectos uma
valorização da mulher: com as santas, de um lado; com o “amor cortês”, de
outro. As santas são heroínas do feminino, que sublimaram sua capacidade de
amar e que se comunicam diretamente com Deus ou são suas intermediarias:
pense-se em Catarina de Siena e seu misticismo, que torna exemplar a
religiosidade e o papel político (profético, de estimulo ao papado) que vem
conscientemente a exercer, colocando-a num plano a que poucos humanos podem
esperar elevar-se (São Francisco e São Domingos, em particular); mas pense-se
também em Joana D’Arc e sua politicidade inspirada, que a leva a estimular o
rei para “salvar a França” e a colocar-se à frente do exército. O “amor cortês”
elabora um código cavalheiresco de amor em que a distância e a impossibilidade
de realizar concretamente o amor desempenham o papel essencial, levando à
idealização da mulher, do seu papel de guia e de conselheira, de alvo de toda
empresa (que se realiza em seu nome) e centro da psicologia do cavaleiro. Toda
a tradição literária que vai dos trovadores aos cultores do estilo novo grafita
em torno dessa imagem ideal do feminino e do papel de inspiradora que a mulher
assume.
Numa condição de subalternidade e de
rebelião colocam-se, entretanto os jovens, os do sexo masculino, sobretudo. São
privados de direitos, dependentes do pai, deixados fora da vida social (que
começa com o casamento, o qual, por sua vez, por razões econômicas e sociais é
frequentemente tardio), alimentando assim as tensões que percorrem a vida
social da Idade Média. A posição deles era semelhante à dos criados e
permanecia-se jovem até o casamento. Daí a necessidade de fazer “explodir” de
forma controlada as suas tensões: com o carnaval, com os ritos populares de
escárnio do tipo charivari (grito de
zombaria), com a vagabundagem e com a aventura; ou favorecendo um controle
através das confrarias, nas quais se entrava com uma cerimônia iniciática e se
aderia a um código ético bem definido. A juventude, porém, permanecia como um
fator de rebelião na sociedade medieval, dando vida a grupos mais ou menos
marginais, a associações mais ou menos legais, embora favorecendo deslocamentos
de um lado para outro da Europa, para seguir os mercadores ou para seguir os
mestres universitários, para exaltar princípios religiosos (como ocorre com as
Cruzadas) ou para participar de peregrinações.
A sociedade medieval educa – como sempre
ocorre nas sociedades tradicionais – através de severos controles, mas também
através de dispositivos de escape (por assim dizer), que se mostram ativos
tanto no caso da criança (exaltada pela inocência) e da mulher (com a
idealização) como no caso da juventude (pela vagabundagem).
4. Educação Patrística
Nome
dado à filosofia
cristã
dos primeiros sete séculos, elaborada pelos Pais da
Igreja, os primeiros teóricos -- daí "Patrística" -- e
consiste na elaboração doutrinal das verdades de fé do Cristianismo e na sua
defesa contra os ataques dos "pagãos"
e contra as heresias.
Quando o Cristianismo, para defender-se de ataques
polêmicos, teve de esclarecer os próprios pressupostos, apresentou-se como a
expressão terminada da verdade que a filosofia
grega havia buscado, mas não tinha sido capaz de encontrar
plenamente, enquanto a Verdade mesma não tinha ainda se manifestado aos homens,
ou seja, enquanto o próprio Deus não havia ainda encarnado, não existia ainda o Senhor.
De um
lado se procura interpretar o Cristianismo mediante conceitos tomados da
filosofia grega, do outro reporta-se ao significado que esta última dá ao
Cristianismo. Os primeiros pensadores
cristãos, ao mesmo tempo em que se valeram, também se debateram com os
filósofos quer com Platão e com Aristóteles, quer, sobretudo, com os estóicos e
com os epicureus. Sem perder de vista os ideais da doutrina cristã, eles
buscaram encontrar, frente à Filosofia e aos filósofos, o lugar apropriado da
reflexão filosófica e do pensar cristão.
"É
comum a afirmação de que o Cristianismo primitivo sofreu influências de vários
setores da Filosofia Grega - de Platão, de Aristóteles, dos epicuristas e dos
estóicos - sem que se determine claramente a amplitude e os limites de tais
influências. Também é comum dizer-se que os filósofos convertidos ao
Cristianismo buscaram dar à doutrina cristã um status filosófico, mas sem o
cuidado de salientar as fontes das quais se serviram ou sem analisar os
conceitos dos quais se apropriaram..." (SPINELLI, Miguel. Helenização e
Recriação de Sentidos. A Filosofia na época da expansão do Cristianismo –
Séculos II, III e IV. Porto Alegre: Edipucrs, 2002, p.3). Foram vários autores
que se ocuparam dessa tarefa: Justino, Tertuliano, Clemente de Alexandria,
Orígenes, Gregório de Nazianzo, Basílio, Gregório de Nissa...
Ou como
resume Johannes Hirschberger: "Tratando-se de filosofia patrística, não
devemos, como outrora, pensar somente nas obras de filósofos que só foram
filósofos. A filosofia da patrística
está antes contida nos tratados dos pastores de alma,pregadores, exegetas,
teólogos, apologetas que buscam antes de tudo a exposição da sua doutrina religiosa.
Mas ao mesmo tempo, levados pela natureza das cousas e dada a ocasião, se põem
- a resolver problemas propriamente pertencentes à filosofia; e então, pela
força do assunto, versam a metodologia filosófica" (HIRSCHBERGER,
Johannes. História da Filosofia na Idade Média. São Paulo: Ed. Herder, 1966,
Trad. Alexandre Correia)
A figura
de maior destaque dessa corrente de pensamento cristão é Santo Agostinho.
Esses
“Padres da Igreja” que ao longo dos sete primeiros séculos foram responsáveis
por confirmar e defender a fé, a liturgia, a disciplina, criar os costumes e
decidir os rumos da Igreja. É a Patrística, basicamente, a filosofia responsável pelo elucidação
progressiva dos dogmas cristãos e a responsável pelo que se chama hoje de Tradição Católica.
A
patrística divide-se geralmente em três períodos:
ü Até o ano
200
dedicou-se à defesa do Cristianismo contra seus adversários (padres
apologistas, São Justino Mártir).
ü Até o ano
450
é o período em que surgem os primeiros grandes sistemas de filosofia cristã (Santo Agostinho, Clemente
Alexandrino).
ü Até o século VIII reelaboram-se as doutrinas já
formuladas e de cunho original (Boécio).
Esta divisão da Literatura Patrística em
três períodos é geralmente feita, mais didaticamente, da seguinte forma:
ü Período Ante-Niceno -
corresponde ao período anterior ao Concílio Ecumênico de Nicéia (324 d.C).
Geralmente compreende os escritos surgidos entre o século I e início do IV
século.
ü Período Niceno -
corresponde ao período entre os anos anteriores até alguns imediatamente
posteriores ao Concílio Ecumênico de
Nicéia (324 d.C). Geralmente compreende os escritos surgidos entre o início do
IV século até o final deste.
ü Período Pós-Niceno -
corresponde ao período compreendido entre os V e VIII séculos.
5.
Educação
Escolástica
A Escolástica (ou Escolasticismo)
é uma linha dentro da filosofia medieval, de acentos notadamente cristãos,
surgida da necessidade de responder às exigências da fé, ensinada pela Igreja,
considerada então como a guardiã dos valores espirituais e morais de toda a Cristandade.
Por assim dizer, responsável pela unidade de toda a Europa, que comungava
da mesma fé. Esta linha vai do começo do século IX
até ao fim do século XVI, ou seja, até ao fim da Idade Média.
Este pensamento cristão deve o seu nome às artes ensinadas na altura pelos
escolásticos nas escolas
medievais. Estas artes podiam ser divididas em Trivium (educação) (gramática,
retórica
e dialéctica)
ou Quadrivium
(aritmética,
geometria,
astronomia
e música).
A escolástica resulta essencialmente do aprofundar da dialética.
A Filosofia
que até então possuía traços marcadamente clássicos e helenísticos,
sofreu influências da cultura
judaica e cristã, a partir do século V,
quando pensadores cristãos perceberam a necessidade de aprofundar uma fé que
estava amadurecendo, em uma tentativa de harmonizá-la com as exigências do
pensamento filosófico. Alguns temas que antes não faziam parte do universo do
pensamento grego, tais como: Providência e Revelação Divina e
Criação a partir do nada passaram a fazer parte de temáticas filosóficas. A
Escolástica possui uma constante de natureza neoplatônica,
que conciliava elementos da filosofia de Platão
com valores de ordem espiritual, reinterpretadas pelo Ocidente cristão. E mesmo
quando Tomás de Aquino introduz elementos da filosofia
de Aristóteles
no pensamento escolástico, esta constante neoplatônica ainda é presente.
Basicamente, a questão chave que vai
atravessar todo o pensamento escolástico é a harmonização de duas esferas: a fé
e a razão. O pensamento de Agostinho, mais conservador, defende uma
subordinação maior da razão em relação à fé, por crer que esta venha restaurar
a condição decaída da razão humana. Enquanto que a linha de Tomás de Aquino
defende uma certa autonomia da razão na obtenção de respostas, por força da
inovação do aristotelismo, apesar de em nenhum momento
negar tal subordinação da razão à fé.
Para a Escolástica, algumas fontes eram
fundamentais no aprofundamento de sua reflexão, por exemplo os filósofos
antigos, as Sagradas Escrituras e os Padres da Igreja, autores dos
primeiros séculos cristãos que tinham sobre si a autoridade de fé e de
santidade.
Os
maiores representantes do pensamento escolástico são os dois pensadores citados
acima, que estão separados pelo tempo e pelo espaço: Agostinho de Hipona,
nascido no norte da África no fim do século IV
e Tomás de Aquino, nascido na Itália do século XIII.
Embora seja arriscado dizer que sejam as únicas referências relevantes do
período medieval, ambos conseguiram sintetizar questões discutidas através de
todo o período: Agostinho enquanto mestre de opinião relevante e autoridade
moral e Tomás de Aquino, pelo uso de caminhos mais eficazes na obtenção de
respostas até então em aberto. Outros nomes da Escolástica são: Anselmo de Cantuária, Alberto Magno,
Robert Grosseteste, Roger Bacon,
Pedro
Abelardo, Bernardo de Claraval, João Escoto Erígena, João Duns Scot,
Jean Buridan
e Nicole Oresme.
6.
A
Educação em Bizâncio e no Islã
Ao lado
do Ocidente cristão e feudal colocam-se dois outros espaços geopolíticos e culturais
que se diferenciam profundamente entre si e em relação ao Ocidente, que
influenciam, porém, o seu imaginário, a sua cultura e até a sua política, que
se colocam num nível de desenvolvimento social e cultural muito mais alto em
relação ao Ocidente, primeiro bárbaro e depois feudal. A Oriente se coloca
Bizâncio, com sua cultura predominantemente grega, com sua continuidade, em
relação ao Império romano (pela unidade do Estado, pela produção do direito,
pelo desenvolvimento do saber e da técnica), com sua sutil cultura teológica e
sua complexa tradição filosófica; mas Bizâncio, durante toda a Alta Idade
Média, terá um papel bastante marginal no desenvolvimento do Ocidente. Ao sul,
porém, encontra-se a dominação do Islã com uma florentíssima civilização, sob
muitos aspectos (técnicos, científicos, filosóficos), mais evoluída em relação
ao Ocidente, que a combate por razões religiosas, mas que também sofre o seu
fascínio e sua influência.
Bizâncio, do ponto de vista educativo,
mantém um modelo constante, ligado a uma rede de escolas municipais em que se
continuava a tradição da Enkyklios
Paidéia, articulada em três ciclos (elementar:
leitura, escrita, cálculo; médio:
gramática ou poética; superior:
retórica), com professores diversamente especializados, que culminavam na
figura do sofista (que ensinava oratória e “filosofia política”). Com o advento
do cristianismo, essa Paidéia também continuou no auge durante muito tempo,
embora integrada com a Escritura.
Assim, define-se uma cultura formativa de
tipo gramatical- retórica ligada a uma língua que se esforça para modelar-se
sobre o grego antigo nutria de ética grega (sabedoria) e de fé cristã; mas
pouco a pouco se dá espaço também para as ciências, a lógica, a música, a
filosofia. “A educação bizantina não ministrava apenas um saber e um modo de
raciocinar; ela oferecia o contato com uma tradição intelectual e moral surgida
na Antiguidade, salva por um Império que foi, nos primeiros séculos da Idade
Média, o refugio da civilização diante dos bárbaros, de Ocidente e Oriente”
(Mialaret & Vial). Com Juliano, o Apóstata, que reina de 361 a 363,
restauram-se o paganismo e a Paidéia antiga, ligada a língua grega e aos
mestres helênicos de Homero a Aristóteles, querendo torná-la viva na escola
através de mestres dotados de “caráter” e de “eloqüência”; depois, com Teodósio
II, que governa de 408 a 450, reforma-se de novo a instrução, fixando a
“publicidade” do ensino, e com Justiniano, que publica em 529 o Codex e
estimula a instrução elementar, os problemas educativos são mais atentamente
teorizados. Do século VII ao VIII houve, pelo contrário, uma “regressão
econômica e cultural, e a instrução sentiu” (Bowen). Só com Miguel III, que
reinou de 842 a 867, é que se reorganizou a escola palaciana com ensinamentos
de filósofos, geômetras, astrônomos e filólogos; depois, com Fózio (810 – 891),
que valorizou os estudos filológicos e “um culto arcaizante da Paidéia” em
chave enciclopédica. A retomada continuou também nos séculos seguintes com
Mikhail Psellos (1018-1078), que exaltou a filosofia e o platonismo; com Ana
Comnena que falou de uma formação cultural grega, através de Platão e
Aristóteles, bem como através do quadrívio. Depois, o cisma com Roma em 1054 e
a conquista veneziana de Constantinopla, os ataques dos turcos levaram a um
declínio e a uma derrota de Bizâncio, cuja cultura emigra para o Ocidente e
alimenta a formação do humanismo italiano. Certamente que a cultura escolar
bizantina, neste percurso, veio, porém, ligando-se cada vez mais à Igreja,
tornando-se menos difusa e permanecendo, sobretudo, como patrimônio de classes
altas.
O Islã também, com sua riquíssima e
complexa civilização, que foi um dos faróis que iluminaram a cultura do
Ocidente medieval, comunicando-lhe conhecimentos técnicos, introduzindo textos
científicos e filosóficos, indicando-lhe tradições interpretativas, teve um
cuidado constante com a educação e a instrução, já a partir de Maomé, é o imã
quem deve conduzir o processo de formação, com seu saber sobrenatural, com seu
papel de guia infalível, por meio de um ensino iniciático que versa sobre a
leitura do Alcorão, interpretado em diversos níveis conforme o grau de
iniciação. Segundo a tradição sunita, porém, deve-se seguir rigidamente o
princípio da autoridade, atendo-se às interpretações mais antigas e
autorizadas, sem assumir nenhuma liberdade de crítica. Nessas escolas
alcoranistas, ensina-se a recitar de cor o texto, de modo a poder usá-lo como
guia em qualquer ocasião, em qualquer experiência de vida. Essa orientação
fortemente religiosa da educação islâmica permaneceu sempre central, também
para os filósofos como Algazel, morto em 1111, segundo o qual a educação deve
ser guiada pelo sufi, o mestre de
vida; este incita a confiar em Deus e a valorizar atitudes de renúncia e de amor.
Também a educação ética, orientada para o belo e para o bom, e que, por meio do
estímulo do desejo de beleza e de bondade, produz a formação do caráter, é
marcada no sentido predominantemente religioso, como afirma, por volta do ano
mil, Miskawayh em sua obra sobre a formação do caráter.
Ao lado das escolas alcoranistas
colocam-se também os preceptores particulares e depois os círculos, nos quais
se ensinam, sobretudo a tradição e o direito, e por onde os jovens passam para
seguir ora aqui ora ali os diversos mestres. Por volta do século X, a cultura
islâmica se abre para as ciências e, criada pelo califa, nasce Bagdá a Casa das
Ciências, uma rica biblioteca que se tornará um centro de estudos e um modelo
de escola para as outras províncias do Islã. No Egito, na Síria, nasceram Casas
de Sabedoria, em que se ensinavam – ao lado da teologia e do direito –
medicina, astronomia, e matemática. No século seguinte, nasce uma instituição
nova, a madrasa ou escola dotada de
uma renda para pagar os professores e acolher os estudantes, criada pelo poder
político para formar os técnicos do Estado e o pessoal da administração,
segundo, porém, uma cultura tradicional.
O Islã foi também uma realidade comercial,
um terreno de intercâmbios, ligados ao nomadismo daquelas populações arábicas,
às rotas das caravanas que ligaram o Oriente ao Ocidente, ao papel das cidades,
à interdependência sobre o mar, portanto ao papel dos artesãos e das oficinas,
onde se realiza sob a orientação de um mestre a formação dos trabalhadores, por
meio de um simples aprendizado, como ocorria no Ocidente. Para a cultura
medieval do Ocidente, o Islã contribui sobretudo com o despertar das ciências
(a começar da álgebra, que foi inventada pelos árabes), com a retomada do
racionalismo filosófico (com a leitura de Aristóteles), com uma série de lendas
e narrativas que alimentaram o imaginário medieval e estimularam a própria
imaginação dos narradores ocidentais.
Entre Bizâncio e o Islã, o Ocidente
alto-medieval vai amadurecendo sua própria retomada que se tornará mais
acelerada e mais sólida depois do Ano Mil, realizando também, e, sobretudo com
as universidades, um novo modelo educativo, radicalmente original e capaz de
desafiar os séculos como sistema de organização da cultura superior.
7. As universidades na Idade Média
Na Idade Média, grande parte das pessoas
não sabia ler e escrever. Os servos trabalhavam desde pequenos no campo, com
isso não tinham tempo para aprender nem achavam alguma utilidade nisso. Além
disso, não existiam escolas para eles. Até alguns nobres eram analfabetos. Para
eles, o que interessava era saber cavalgar, vestir uma bela armadura, empunhar
armas. Não precisavam ler ou escrever para terem um feudo, conquistar belas
damas e se divertirem. Os responsáveis de cuidar das escolas eram os monges e
os padres.
Durante o século XIII, as cidades voltaram
a ser importantes na Europa. O crescimento das cidades estimulou a vida
intelectual. Por esse motivo, esse foi também o século do triunfo de uma nova
instituição; a Universidade. Surgiram universidades como as de Bolonha, Oxford
e Paris. Tais universidades eram protegidas tanto pela Igreja como pelos
grandes senhores feudais. Os cursos ministrados nas universidades eram
Medicina, Direito, Teologia e Filosofia. As ciências da natureza não eram muito
desenvolvidas, e praticamente só repetiam o que os gregos e os árabes já tinham
dito.
Os universitários eram filhos de nobres
que vinham de toda Europa. As universidades formavam as pessoas da elite
medieval. O método de ensino era denominado de escolástico: os alunos estudavam
comentários sobre ele e debatiam. No entanto, nesses debates ninguém
questionava o que os grandes autores diziam. A autoridade deles era absoluta. É
por isso que, séculos mais tarde, a escolástica foi considerada uma forma de
estudo dogmática (bitolada).
8.
Curiosidades
·
Em 1976 transcorreu o milésimo qüingentésimo
aniversário da queda de Roma. O evento passou em silêncio. No entanto, esse
fato histórico revestiu-se de profundo significado histórico, já que serviu
para indicar o fim da Idade Antiga e o início da Idade Média.
·
A 2 de novembro de 472 morreu Olíbrio, e em
junho de 474 Júlio Nepos triunfou de Glicério; e aí surgiu o chefe da milícia
Orestes, o último dos generais que durante muitos anos faziam e desfaziam os
imperadores. Ele tomou o poder, mas não ousou tornar-se o chefe supremo do
Império, e instalou o seu filho Rômulo Augústulo no trono imperial a 31 de
outubro de 475. Devido à sua idade de 13 anos, Rômulo foi chamado de Augústulo
por Zenão, imperador do Oriente. Por notável coincidência ou por ironia da
sorte, como diz Villari, o último imperador do Ocidente tinha o mesmo nome do
primeiro rei - Rômulo - e o do primeiro imperador de Roma - Augusto . O
exército romano era composto de torcilingos, esciros, hérulos, e os soldados
passaram a exigir um terço das terras que controlavam, a fim de se fixarem e
terem a sua subsistência. Orestes recusou, e aí sobreveio a rebelião, os
soldados abandonaram-no e aclamaram Odoacro rei, transportando-o sobre os
escudos. Odoacro, rei dos hérulos ou dos torcilingos segundo Jordão na Gética,
era um bárbaro do exército de Ricimero junto com o qual havia assediado Roma.
Isso ocorreu - esse triunfo de Odoacro - a 23 de agosto de 476. O novo rei prometeu
aos soldados o que haviam pedido, Orestes fugiu para Pavia, Roma foi pilhada
durante três dias e, a 28 de agosto de 476, Orestes foi preso e morto em
Piacenza. Odoacro foi, então, buscar Rômulo Augústulo em Ravena e confinou-o na
vila Luculana em Pizzofalcone perto da antiga Nápoles, com uma pensão de 6.000
sólidos. Odoacro empacotou as insígnias imperiais e enviou-as a Bizâncio. Caíra
o Império Romano do Ocidente e começara a Idade Média. A irrupção das tribos
germânicas através das fronteiras e a sua fixação nas províncias do Império do
Ocidente marcaram o fim do mundo antigo e caracterizaram o início de novo
período histórico. Por isso, quando Walsh discorre sobre o humanismo medieval,
ele o concebe como a integração de elementos antigos tal como a sabedoria
grega, a experiência da vida ou o senso de organização dos romanos e da Graça
evangélica proveniente do Oriente com os novos fatores como a força dos
germanos e a imaginação dos celtas [45]. Maurice De Wulf, por seu lado, observa
que, na primeira parte da Idade Média, as novas raças dos celtas e teutões
receberam passivamente a herança cultural e o legado jurídico e político de
origem greco-romana mas que, desde o século IX, entraram a reagir ante o que
lhes foi proposto e assimilaram o patrimônio tradicional sob a orientação da
Igreja Católica.
·
Durante os primeiros séculos da Idade Média,
o Cristianismo introduziu-se entre os povos bárbaros. A maior parte deles já
aderira ao arianismo e, por isso, eram cristãos heréticos na época das grandes
invasões. Assim, já eram cristãos os godos, os burgúndios, os vândalos e,
depois, os lombardos. Os francos e os saxões eram pagãos.
·
A partir do fim do século IV, os missionários
católicos converteram os francos à fé cristã, após o batismo do rei Clóvis, no
Natal de 496, e os anglo-saxões dos sete reinos, por iniciativa do Papa São
Gregório Magno (590-604).
REFERENCIAS:
·
CAMBI, Franco. História da Pedagogia. São
Paulo: Fundação da Editora UNESP, 2009.
·
NUNES,
Ruy Afonso da Costa. História da Educação na Idade Média. São Paulo: EPU, 1979.
Produção coletiva.
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